Gran Turismo 7 é o jogo que uso para medir a minha evolução em simuladores de corridas. No primeiro jogo na Playstation 1, mal conseguia fazer os treinos mais básicos e agora, anos depois, já consigo fazer os treinos, acabar corridas sem me espatifar contra todas as paredes que apanho e até ganhá-las de forma bastante consistente.
É um jogo que na minha opinião, vamos aprendendo a apreciar cada vez mais com a idade. Isto não significa que Gran Turismo seja um jogo para velhos, mas existem certos elementos que começamos a notar e a apreciar quando atingimos certos pontos da nossa vida.
Quando tiramos a carta de condução, aprendemos a não conduzir à bruta e ganhamos uma noção maior de como se abordar uma curva ou fazer uma ultrapassagem. Quando começamos a receber o nosso ordenado e podemos começar a comprar coisas que antes não podíamos, começamos a apreciar as coisas mais requintadas porque entendemos melhor o seu valor.
Forza Horizon 5 foi o melhor jogo de corridas de 2021 e, apesar de não existir comparações com Gran Turismo 7 por serem tão diferentes um do outro, o choque de paradigmas é muito interessante. Por vezes gosto de ouvir Heavy Metal, outras gosto de um bom Jazz. Gosto de um bom bitoque mas por vezes um prato mais requintado ou gourmet também é excelente.
Se Forza Horizon 5 é como ir ao McDonald’s e comer o vosso hamburger favorito acabado de fazer e bem montado, Gran Turismo 7 apresenta-se como um restaurante com estrela Michelin com comida feita lentamente e maior atenção ao detalhe. Ambos são deliciosos e dependem apenas se querem algo mais rápido e caótico ou algo mais controlado e calculista.
Um hino à história automóvel
Um dos grandes focos de Gran Turismo 7, é mostrar o seu amor pela história automóvel. A “campanha” tem como objetivo aumentar a vossa coleção de carros com diversas marcas e categorias, enquanto expõe a sua história, desde a sua origem até à atualidade.
No mapa mundo, o vosso ponto central é o Café. Um local requintado no qual recebem as vossas missões sob a forma de menús. Estes requerem que compitam em diversas corridas em várias pistas conhecidas pelo mundo fora, tendo de terminar em 3º lugar ou melhor para receberem um carro de presente.
Ao fim de cada menu, recebem um cartão que serve de “loot box”, no qual podem receber créditos, componentes para carros ou até carros para a vossa coleção.
Isto tem a enorme vantagem de vos permitir competir sem terem de comprar um carro novo para cada conjunto de provas. Apenas apanhei duas exceções que me obrigaram a comprar um carro porque era preciso uma marca específica, mas eram carros baratos, pelo que o impacto na carteira não foi muito grande.
A maioria dos créditos que vão gastar, vai ser na loja de tuning, na qual podem comprar componentes para o vosso carro que aumentam a sua performance.
Podem comprar coisas como pneus, escapes, controladores para o motor, suspensão ou travões, computadores de bordo, filtros, entre muitos outros.
As corridas eventualmente começam a colocar tetos máximos de performance, o que significa que têm de ter em atenção os upgrades que compram e ajustá-los para atingir a maior performance sem passar o limite. Para os utilizadores mais avançados, podem alterar os valores de forma granular e até criar folhas de tuning, que podem escolher para carregar automáticamente valores que se adaptam à prova que estão a fazer.
Por exemplo, podem criar um tuning para uma corrida com poucas curvas, com grande foco em aumentar a velocidade máxima e alterar para um tuning feito para uma pista como Nurburgring, que possui imensas curvas e podem querer aumentar a vossa aceleração para recuperarem mais rápido a velocidade após uma curva.
O prazer da condução
Sendo Gran Turismo 7 um simulador de corridas, existe uma dificuldade adicional que não vemos em muitos outros jogos mais arcade. As curvas são mais difíceis de fazer porque têm de tomar atenção à velocidade e forma como as abordam, não podem simplesmente meter o pé a fundo e esperar que consigam terminar as corridas em 1º de forma fácil.
Mesmo com algumas assistências, ainda têm de se acautelar com isto. Pessoalmente, achei que algumas assistências pré-definidas só complicavam a condução, como uma que travava automáticamente o carro se estivessem a conduzir demasiado rápido no segmento em que estavam, ou um que vos mexia na direção para colocar na linha da curva, o que impedia algumas ultrapassagens cruciais.
No fim, apenas deixei o ABS e as linhas guias na estrada, simplesmente porque existem alturas em que não veem nada à frente e também como uma forma de ir aprendendo as pistas.
Conduzir carros neste jogo é um enorme prazer. Desde a forma como o vosso condutor passa as mãos no volante, ao pormenor dos dedos a dobrarem para pressionar a patilha das mudanças, existe algo bastante satisfatório em precionarem o gatilho ao de leve para não acelerar muito na curva e ver o vosso carro a responder imediatamente e com enorme estabilidade.
A visão do cockpit neste jogo é uma das minhas favoritas até hoje, com excelente visibilidade para a estrada, sem partes do carro a obstruir a visão e excelente “camera shake” que dá ao carro uma sensação de realismo, peso e impacto maior.
A sensação de velocidade também é excelente, especialmente em carros como um Fórmula 1 que atinge velocidades estonteantes e até causa algum medo quando veem os cenários a passar incrivelmente rápido pelo canto do olho.
As condições climatéricas estão brilhantes neste jogo e afetam imenso a forma como atuam na pista. Conduzir à chuva com pneus suaves é praticamente impossível. Não conseguem fazer curvas, a vossa distância de travagem é altamente afetada e até sentem o carro a patinar quando fazem uma aceleração repentina. Não existe algo mais assustador neste jogo que começar a chover em Nurburgring enquanto estão a correr com pneus suaves.
Infelizmente não existe forma de saberem se vai chover durante uma corrida de forma consistente. Existem uns pop-ups de profissionais de Gran Turismo que vos dão algumas informações sobre a pista, quais os segmentos mais difíceis e como abordá-los e por vezes falam do clima.
Tirando isso, apenas podem ver o céu enquanto estão a ver a prévia da pista, durante o menú inicial para perceber se está nublado ou não. O vosso carro tem uma opção de radar de clima que mostra as zonas onde vai existir precipitação na pista e a intensidade.
As vossas duas hipóteses são conduzir com pneus de chuva ou híbridos, que afetam a performance do vosso carro e é um risco caso não chova, pois coloca-vos em desvantagem ou trocam os pneus durante a corrida com uma paragem nas boxes, mas isto é algo que não conseguem fazer durante as corridas do modo história pois o número reduzido de voltas não permite que consigam recuperar a vossa posição.
Esta é uma das minhas queixas em relação ao jogo. A principal dificuldade não vem da IA em si, se bem que por vezes é excessivamente agressiva e não vos facilita as ultrapassagens ou ainda abalroa o vosso carro só porque sim.
A principal dificuldade é o facto de serem colocados sempre em último nas corridas e por vezes o número de voltas não vos deixa chegar às posições cimeiras. Se cometerem um erro é praticamente impossível em certas pistas, especialmente quando as primeiras posições levam meia volta de avanço quando começam a corrida.
Depois a IA, vai do 8 ao 80, como costuma ser hábito nos jogos de corridas. Na dificuldade normal, até os passarem fazem a vossa vida num inferno e depois disso simplesmente desistem de correr. A única forma de vos ultrapassarem é se cometerem um erro ou se se despistarem. Depois existe a dificuldade mais alta que é literalmente impossível de vencer. O seu carro anda mais rápido e não comete um único erro, fazendo as curvas de forma perfeita. É uma dificuldade para desafiar os profissionais e não um jogador mais casual como eu.
As provas mais difíceis continuam a ser, de longe, as missões da escola de condução. Ter medalha de bronze em todas é bastante mais fácil que em jogos anteriores e ainda é possível obter várias de prata e algumas de ouro sem grande dificuldade. Mas existem provas, como as da Super License que requerem que façam uma volta inteira a várias pistas de forma cronometrada e sem saírem da pista ou colidir com paredes.
Estas são as que requerem mais paciência e otimização e apesar de parecer uma montanha impossível de escalar, há medida que vão conhecendo as pistas e os carros, começam a perceber as limitações e melhor forma de abordar cada segmento, melhorando assim a vossa performance.
Existem ainda missões que envolvem corridas de ultrapassagem, na qual têm um espaço limitado da pista para ultrapassar todos os veículos à vossa frente sem colidir com eles, competir numa volta inteira, entre vários outros.
Algo que tanto isto como a escola de condução têm de excelente, é que existe um incentivo para concluir todas as provas com ouro, pois recebem um automóvel exclusivo, o que é obrigatório se quiserem concluir a vossa coleção.
Carros para todos os gostos
Existem mais de 400 carros em Gran Turismo 7. Desde carros que vemos no dia-a-dia até super carros e carros de pista, existe um pouco de tudo para todos os gostos. Ao contrário do que se via em jogos anteriores, não existe a distinção entre carros normais com interiores genéricos e carros premium mais detalhados.
Todos os carros são incrivelmente detalhados, com particular destaque no cockpit que usa o mesmo painel de instrumentos das versão real até às texturas do volante e do tablier.
Os sons dos carros são altamente realistas e até o facto de meterem um turbo no carro altera o som, ouvindo o ar a ser absorvido pelo sistema de turbo, mais ainda se tiverem equipado um supercharger.
Cada carro possui um peso e tempo de resposta diferentes e é fantástico irem descobrindo quais são os que gostam mais, há medida que vão desbloqueando carros novos.
Algo que Gran Turismo 7 faz diferente de Forza Horizon 5, é que no Forza é bastante fácil obter os melhores carros rapidamente, uma vez que chovem carros mesmo que não façam os conhecidos “cheeses”. Em Gran Turismo 7 recebem imensos carros bons durante as missões dos menús, incluíndo alguns Ferraris, Porsches entre outros, mas quando terminam, a torneira fecha e para obterem mais créditos têm de concluir a missão diária de fazer um certo número de quilómetros e competir em corridas para ganhar créditos, cuja quantidade aumenta com o número de voltas.
Ao terminar as missões do Café, tinha 76 carros na coleção, sendo que alguns deles comprei e outros recebi por terminar as licenças de condução ou nas loot boxes. Ainda fiquei com 1.3 milhões de créditos na carteira, mas existem imensos carros que custam mais do dobro disto, o que significa um grind enorme para completar a vossa coleção, algo que acho podia ser aliviado com um update que aumentasse a quantidade de créditos por corrida.
Isto aumenta o foco nas microtransações, que podem tornar certos carros imensamente caros em dinheiro real, o que é algo incomum em jogos exclusivos da Playstation, que costumam ser amigos do consumidor.
Como alternativa, podem sempre ver a loja de carros usados que muda frequentemente e permite obter alguns destes carros a um preço mais razoável.
Gráficos, performance e som
Graficamente, Gran Turismo 7 é muito bom mas ainda peca nalguns locais. Primeiro, o bom: os carros. Altamente detalhados, desde os interiores ao exterior, cada curva dos carros exube realismo e nos modos em que o Ray tracing está ativo, o contraste entre os reflexos causados pelos materiais reflexivos e os materiais baços permite um show de luz e sombras bastante realista.
Depois a sky box dos cenários é brilhante, especialmente com o ciclo de clima e dia-noite altamente realistas, que vão banhando certas partes das pistas com a luz do sol ou dão-lhe um aspeto mais simples e triste quando está o céu cinzento.
As núvens são altamente detalhadas e mudam de densidade e claridade quando está mais próximo de chover. Durante a chuva, a pista vai ficando progressivamente mais molhada, com o os carros a levantar essa água ao passar, o que dificulta imenso a visibilidade para quem vem atrás. Mesmo depois de parar a chuva, a pista vai secando ao longo do tempo, assim como os carros.
Durante a noite, as luzes dos carros que vêm atrás de vocês espalham sombras no vosso habitáculo e por vezes até encandeiam e reduzem a vossa visibilidade. Em certas pistas, durante a noite apenas conseguem ver o que as vossas luzes iluminam, dando uma espécie de visão de túnel da estrada.
Agora o mau: apesar do foco ser claramente a pista e os carros, está mais que na altura de começar a ter atenção aos detalhes exteriores como a relva ao longo da pista, as árvores, o público e até os lagos.
A relva ao longo da estrada faz pop-in quando se aproximam e parecem pequenos traços verdes que estão suspensos sobre o chão. As pessoas ainda parecem feitas de cartão com uma ou outra exceção como os fotógrafos ao longo da pista que vos tiram uma foto quando se aproximam. As árvores até possuem algum detalhe mas são pouco densas e nota-se algum desleixo no seu posicionamento e a água dos lagos em certas condições de iluminação mostram a repetição da sua textura, dandolhe um aspeto feio. Certas montanhas no exterior do cenário até possuem texturas de baixa resolução, algo que é desapontante.
O Ray tracing apenas estar disponível nos replays e nos modos de fotografia é outra desilusão, algo que já tinha acontecido em Forza Horizon 5. Espero que ainda nesta geração seja possível ter reflexos, iluminação e sombras com ray tracing, mantendo os 4K com 60 fps de performance. Talvez quando o FSR chegar às consolas tal seja possível.
Existe um modo chamado Scapes, no qual podem tirar fotos aos vossos carros em vários locais do mundo, incluíndo Portugal. Ainda é possível usar o modo de fotografia nas corridas, mas apenas no fim e durante o replay, mas as opções são bastante amplas, como escolher vários ângulos predefinidos ou posicionar a câmara à vossa vontade.
A banda sonora é bastante variada com temas mais pop, rap, rock, instrumental, jazz e até música clássica. Existe algo para todos os gostos. Infelizmente não é possível, ou pelo menos não encontrei forma de mudar a música durante as corridas.
A equalização do som foi algo que gostei bastante. Durante as corridas o foco são os carros e nunca senti que a música se intrometesse por cima do som dos carros.
Por fim, existe algo que foi absolutamente brilhante neste jogo que é a integração com o comando Dual Sense. É possível sentir cada deformação da estrada e em certas corridas, como as de rally, chegam ao fim destas cansados das mãos, mas no bom sentido, porque existe essa imersão extra por sentirem que estão a conduzir um carro verdadeiro. Não sei se existem volantes com haptic feedback mas se existirem e funcionarem com este jogo, deve ser de longe, a melhor experiência de condução que podem ter em qualquer jogo.
Conclusões
Gran Turismo 7 é um excelente jogo de corridas e altamente viciante. A condução é excelente e existem imensos carros para colecionar.
Apesar de ainda existirem algumas falhas, especialmente ao nível dos exteriores das pistas e da IA que ainda não é a melhor, é algo que não afeta assim tanto a vossa experiência com o jogo. Ainda existem os modos multijogador, que é algo que simplesmente não me atrai, mas possui regras próprias e é uma espécie de mundo à parte dentro de Gran Turismo. Eu pessoalmente gosto de jogar isto de forma mais casual e relaxada.
Gran Turismo 7 é uma autêntica carta de amor à história dos automóveis e se gostam de carros, vão adorar este jogo.
