A série de jogos de Fórmula 1 (F1) da Codemasters tem sido, para mim, uma das séries anuais mais consistentes em termos de qualidade no que toca a jogos de desportos/corridas. Mesmo os jogos que são menos conseguidos têm sempre bastantes pontos positivos, muito pelo facto de serem construídos sobre uma fundação extremamente sólida, que tem vindo a ser polida ao longo dos anos.
F1 23 é a nova entrada na série e talvez a que mais gostei de jogar desde que a comecei a jogar em 2018. A Codemasters, agora sob a alçada da EA tem conseguido elevar a fasquia destes jogos no que toca a autenticidade e imersão. Vamos ver o que F1 23 tem para nos oferecer.
Breaking Point Parte 2
O modo de história Breaking Point volta em F1 23 e continua essencialmente após o fim da primeira parte, na época de 2022.
Voltamos a seguir os eventos em torno da rivalidade de Aiden Jackson e Devon Butler agora numa nova equipa, Konnersport, criada pelo pai de Devon.
Além de Aiden e Devon, seguimos ainda Callie Mayer, a irmã de Devon e uma piloto bastante promissora na categoria de F2.
Imediatamente aquilo que percebemos é que Breaking Point 2 é muitos furos acima da primeira parte.
Para começar, as cinemáticas estão incrivelmente bem produzidas com captura de movimentos da mais alta qualidade e excelente performance dos atores.
A história também melhorou bastante em termos de escrita, especialmente no que toca aos personagens e nas suas interações. Confesso que alguns dos diálogos conseguiram colar-me completamente ao ecrã. O desenvolvimento dos personagens também é muito melhor, especialmente o de Devon que tem um arco de personagem muito interessante e do qual não estava à espera.
Nesta segunda parte, não só controlamos os pilotos como também temos de tomar decisões enquanto chefe de equipa. Certas decisões como onde alocar recursos, permitir ou não que os pilotos participem em atividades fora do âmbito da equipa ou até o que responder a certas questões da imprensa aumentam ou diminui a moral da equipa no que toca a performance e à imagem que deixa ao público. Um nível alto de performance ou imagem pode até abrir novas respostas às decisões que temos de tomar.
Algumas destas decisões até têm impacto nas corridas, especialmente no nosso objetivo extra e até na posição em que os companheiros de equipa podem acabar.
Existem também mais corridas “scripted” do que na 1ª parte e também desenvolvem mais a história do que faziam anteriormente. Existem menos corridas completas em que temos de competir.
Isto é algo que gostei e não gostei ao mesmo tempo. A principal razão são as opções de dificuldade.
F1 23 tem uma dificuldade bastante ajustável, que vai de 0-100 e essencialmente define o pacing dos carros controlados pela IA. No entanto, Breaking Point tem a sua própria dificuldade e podemos escolher entre Normal, Challenging e Hard.
O meu problema com isto é a afinação de cada dificuldade. Normal é estupidamente fácil e o salto de dificuldade para Challenging é bastante alto. Considerando que a maioria das corridas tem objetivos do estilo “ultrapassar o piloto X” em cerca de 3 ou 4 voltas, fica bastante difícil completar isto no pouco tempo que temos. Se fosse uma corrida que começasse do início era bastante acessível, mas não neste modo.
Diria que uma das principais causas disto é o facto de geralmente ser o primeiro modo de jogo que a maioria dos jogadores vão experimentar. O carro que conduzimos em Breaking Point geralmente não está na melhor performance devido aos acontecimentos da história e acaba por ser uma experiência enganadora do que temos no resto de F1 23.
Algo que também não ajuda é o facto de, pelo menos para mim, ser sempre preciso algumas voltas antes de ficar bem acostumado com as pistas, um luxo que não temos em Breaking Point a não ser que estejamos sempre a recomeçar o evento.
No entanto, tirando estas duas queixas, Breaking Point é excelente e eventualmente lá atinei com o modo Challenging e consegui terminar a história.
F1 World é um bom começo mas precisa de ser afinado
Quando vi o anúncio de F1 World, confesso que fiquei um pouco preocupado afinal estamos a falar de um modo que segue o mesmo fundamento do que o Ultimate Team faz no FIFA e são conhecidos os problemas com esse modo, no que toca à monetização.
Imediatamente, F1 World é bastante mais contido que o Ultimate Team e até possui uma base bastante sólida. Mas precisa de ser afinada porque acho que a Codemasters subestimou de certa forma a base de jogadores.
Mas o que é F1 World? Essencialmente, é uma compilação do que tínhamos nos jogos anteriores em separado como Grandes Prémios, Time Trials ou corridas online que podíamos aceder no menu principal e agora está dentro deste novo modo.
Além disso, existem agora duas opções novas: séries e eventos single/multi jogador.
A parte “Ultimate Team” entra no facto de poderem ter o vosso próprio piloto e ao terminar corridas e missões recebem partes para o vosso carro, que permite aumentar o seu nível técnico. Estas partes são aleatórias e cada uma pode oferecer bónus diferentes, dentro da própria categoria.
Estes bónus incluem efeitos como aumento da Downforce do nosso carro, melhoria no sistema de DRS, melhor eficiência do combustível, maior redução de peso além de outros efeitos temporários que incluem estes que mencionei mas num valor mais alto por um tempo limite após efetuarmos certas ações como sair das boxes, fazer uma volta “limpa”, isto é, sem quebrar as regras, etc.
Cada peça possui raridades: incomum, raro, epico e lendário e quanto maior a raridade, mais e melhores bónus vão ter.
Este sistema de peças pode parecer preocupante mas até está bem implementado uma vez que existe um sistema que vos permite fazer o crafting de qualquer peça e de qualquer raridade, obviamente com custos acrescidos para as mais raras, mas que pode ser facilmente “farmado” pelos jogadores mais dedicados.
Mas qual é o principal problema com este sistema? Ao contrário do resto do jogo, que tem um nível de dificuldade personalizável, a dificuldade dos eventos single player em F1 World está ligado ao nível técnico do vosso carro.
Imediatamente ao começarem este modo, especialmente se tiverem a Champions Edition, vão receber peças por completar o tutorial que vos vão colocar muito acima do nível técnico das primeiras corridas, fazendo com que essencialmente estejam a jogar contra a IA em modo Easy, o que se traduz em vocês essencialmente, estarem a correr sozinhos durante 99% da corrida.
Eventualmente vão desbloqueando corridas de maior nível técnico que são muito mais desafiantes mas estamos a falar ao fim de 3-4 horas de jogo neste modo. Uma boa maneira de tornarem estas corridas mais desafiantes seria equiparem peças com nível menor, fazendo com que ficassem ao nível dessas corridas, mas infelizmente, o número de peças sobresselentes que podem ter por slot é limitado, e não existe forma de guardar “builds” com vários níveis que podem equipar a qualquer momento. Além disso, as peças que podem fazer “craft” costumam vir no mínimo ao vosso nível, o que não ajuda neste caso.
Isto acaba por se tornar também um problema em corridas multijogador, uma vez que vai existir um grande espectro níveis nos carros dos jogadores.
Foi nisto que a Codemasters sobrestimou a base de jogadores de F1 23. Este sistema torna as corridas multijogador inconsistentes, algo que vai contra o princípio da Fórmula 1 que geralmente almeja a perfeição e a consistência.
Não seria um problema se as corridas online do F1 World fossem a única opção para competir contra outros jogadores, uma vez que existem partidas online com os carros das várias marcas já existentes, mais as partidas por rank.
Considerando que a base de jogadores de F1 23 é uma fração minúscula da base de jogos como FIFA, Madden ou NBA, o resultado é os eventos de multijogador estarem praticamente às moscas, tornando-se basicamente em corridas mistas contra 2 ou 3 outros jogadores e pilotos controlados pela IA.
Ainda assim acho que este modo tem bastante para oferecer, mas acho que Codemasters devia-se focar mais nele como um dos principais modos de single player, especialmente depois de ter visto o modo carreira deste ano.
Os eventos oferecem-vos não só peças, mas também vários tipos de moeda. Existe o Track Data, Insight, Critical Insight, dólares, etc. Estas moedas podem ser obtidas também ao desmantelar as peças que não usam ou estão desatualizadas e são usadas para adquirir peças no modo de crafting (chamado Engineering, já agora).
Também existem Goals, que são objetivos que podem comprar com o vosso dinheiro do jogo e oferecem mais recompensas, conforme a sua dificuldade aumenta. Estes objetivos incluem fazer um certo número de voltas em eventos de vários tipos ou países, participar em jogos online, terminar no pódio, fazer um certo número de milhas, etc.
Além disso existe também o Compendium, um modo parecido ao que já existia em Gran Turismo 7 e que é sempre um bom extra para se ter num jogo destes.
Ao desmantelarem as vossas peças, podem obter autocolantes. Estes autocolantes são usados no Compendium para desbloquearem fotos de momentos da história da F1 que também incluem descrições, como se fossem entradas de Lore da história da F1. Além disso, se tiverem pontos de Insight de sobra, podem usar alguns para desbloquear autocolantes que vos faltem no Compendium, caso o vosso RNG não esteja convosco.
Apesar dos problemas da dificuldade inicial do F1 World, acho que o modo acaba por ser bastante amigável para os jogadores. Mas porque haveria a Codemasters de focar este modo como o principal Single Player, tirando o Breaking Point? Porque:
Modo de carreira não tem nenhuma novidade
Exatamente isto: o modo carreira deste ano é essencialmente cópia do ano passado e, se a minha memória não me falha, também de 2021 que tenho ideia de ter sido o ano em que fizeram alterações a este modo. 2022 teve essencialmente uma mudança na interface, que tornou mais fácil o sistema de upgrades, mas este ano as únicas mudanças que vi foram estéticas no que toca aos cenários do menu principal.
Como resolver isto? O modo Carreira de F1 sofreu o mesmo destino do homólogo da série FIFA, quando veio o Ultimate Team. Deixou de ter updates e morreu.
A solução? Fazer um F1 Manager Lite. O F1 Manager não é da EA, mas isso não significa que a Codemasters não possa fazer um modo de gestão que nos coloca no papel dos membros de uma equipa, fazendo com que tenhamos de gerir as estratégias, R&D, patrocinadores, etc.
Naturalmente não precisa de ter a mesma profundidade de F1 Manager, seria o mesmo que pedir para colocarem o Football Manager no FIFA, mas uma versão mais simplificada podia se calhar até trazer mais jogadores casuais que até estão curiosos, mas têm medo de se comprometer a entrar neste sub-domínio da F1.
IA muito melhor, mas não perfeita
Um dos aspetos mais positivos de F1 23, é a clara melhoria na inteligência artificial dos pilotos controlados pelo computador.
Nas primeiras 2 horas de F1 23, devo ter tido mais lutas renhidas por posição que em todo o tempo que joguei F1 22. A IA está muito mais realista, se os tentarem ultrapassar, é melhor que tenham confiança pois eles vão espremer-vos até ao limite das regras. Sempre foi uma das coisas que mais gosto de ver nas corridas de F1 e sempre tive pena de os jogos não conseguirem transmitir essa sensação.
No entanto ainda está longe de estar perfeita. Existem muitas situações em que carros mais lentos não saem da linha de corrida, afetando o vosso tempo. Por vezes ainda vos atropelam completamente quando vos estão a ultrapassar, como se não estivessem lá. O pior caso que me aconteceu, foi estar a dar uma volta de avanço num adversário que tinha de me facilitar a ultrapassagem por ser mostrada a bandeira azul, apenas para o ver colocar-se imediatamente atrás de mim, ativar o DRS para me ultrapassar e me atirar para fora da pista depois de me bater por trás.
Novo sistema de tração torna F1 23 extremamente agradável de jogar
O sistema de tração de F1 23 foi atualizado e está imensamente melhor que o de F1 22. O carro agarra melhor ao chão e torna muito mais fácil fazer as curvas sem o deixar fugir.
No entanto, existem algumas mudanças interessantes. Por exemplo, as curbs (limitadores da pista) não podem ser usados como muleta com a mesma consistência do ano passado, especialmente as mais altas, uma vez que causa uma quantidade enorme de understeer fazendo com que o carro fuja do nosso controlo.
O mesmo acontece com as secções fora da pista, especialmente as que são de relva, onde uma curva mal feita pode significar passar em cima destas zonas que essencialmente remove todo o grip dos pneus.
Falando em pneus, o sistema de degradação progressivo está excelente este ano, pelo menos no que toca à simulação. No início das corridas, a tração é excelente e o carro agarra muito bem ao chão, mas o desgaste eventualmente torna-se notório e temos de ajustar a nossa condução até chegar a janela de ir às boxes trocar de pneus.
Pessoalmente gosto de travar bastante em cima das curvas e acelerar forte nas saídas, o que provavelmente não é o ideal para a gestão dos pneus. Também se nota mais a diferença de velocidade e tração quando passamos para pneus com composto mais duro como os médios ou os duros.
Quando comecei a jogar, pensei para mim que seria bom poder importar os setups dos carros do jogo anterior para este, mas depois de começar a ver os setups que os jogadores profissionais usam, as diferenças são imensas para isto ser possível.
Outro elemento no qual é notória a melhoria de tração é nas partidas. Em F1 22, estar nem que fosse uma fração afastado das RPM ideais significava uma partida menos boa, ou até mesmo má. Em F1 23 existe muito mais espaço para cometer erros e cheguei mesmo a conseguir arrancar sem perder controlo do carro com as luzes das rotações a bater no máximo.
Competir com comando
Durante quase todo o tempo que joguei F1 22 e F1 23, dei uso ao meu volante Thrustmaster T300RS GT. Não é um volante topo de gama todo XPTO com Direct Drive como os que se veem os streamers e jogadores profissionais usarem, mas não deixa de ser um volante caro e de enorme qualidade.
A imersão que têm a jogar um jogo destes com volante não consegue ser batida por um comando mas quando falamos de ser competitivos, a Codemasters é bem capaz de ter conseguido atingir o ouro neste jogo.
Até F1 22, se querem fazer bons tempos têm de usar um volante. O comando não oferecia opções suficientes para conseguirem controlar o carro de forma consistente ao jogar sem assistências.
Com volante, as únicas assistências que uso no que toca à condução do carro é caixa automática (ainda não tive paciência para aprender a usar a caixa manual) e ABS. Jogar sem controlo de tração com comando no ano passado seria impensável e quando experimentei, cada curva era um peão.
Em F1 23, a Codemasters introduziu um sistema chamado Precision Drive, que permite um controlo muito maior do acelerador, travão e do volante com os gatilhos e analógico do comando.
Após ver uns vídeos sobre as melhores definições para usar dentro do jogo, consegui um setup que me permitiu não só controlar o carro de forma fenomenal com o Dualsense usando as mesmas assistências que uso com o volante, como até consegui bater alguns dos tempos que tinha feito com o volante.
O mais incrível, foi o facto de com o comando ser muito mais fácil para mim recuperar de um oversteer ou understeer, algo que acho mais difícil no volante, especialmente com o force feedback a tornar o volante mais pesado e difícil de controlar. Isto permite que seja ainda mais agressivo nas curvas sem ter medo de perder o controlo do carro.
Gráficos, performance e som
Graficamente, F1 23 é bastante bom especialmente devido ao sistema de iluminação mais realista em relação a F1 22. Este sistema nota-se em especial nos elementos metálicos do carro que o fazem parecer menos como se fosse um carro de brincar.
As corridas noturnas também são bastante boas devido ao contraste mais natural causado pelas luzes, especialmente em pistas como a de Singapura ou Las Vegas.
A performance é no geral boa, a 60 FPS mesmo com o modo gráfico não estando em Performance. As únicas exceções é em corridas à chuva mas apenas quando saímos do Instant Replay, que não só causa uma queda de FPS que pode afetar a condução momentaneamente, como a própria textura da chuva causa alguns bugs que tornam bastante difícil ver a estrada.
O som dos carros é excelente, especialmente quando estamos a subir nas mudanças e conseguimos sentir o poder do motor a funcionar. No entanto quando estamos na 8ª mudança, o som do carro parece menos realista do que nas outras, não sei se será um bug e é difícil de explicar por escrito.
A banda sonora é surpreendentemente agradável. Não sou grande fã de música eletrónica mas a música dos menus em F1 23 faz-me lembrar aquela música eletrónica de ginásio dos anos 90, com partes que o meu antigo professor de música diria que são “orelhudos”, pois são bastante agradáveis ao ouvido.
Conclusões
Se compraram F1 22, vale a pena comprarem F1 23? A primeira resposta que me vem à cabeça é que sim se: jogaram o primeiro Breaking Point e estão interessados na segunda parte; se odiaram profundamente o sistema de tração de F1 22 ao ponto de o não quererem jogar; se acham que têm paciência para a facilidade das primeiras horas de F1 World.
Caso sejam jogadores que viveram no online de F1 22, provavelmente já têm F1 23, portanto nada disto se deve aplicar a vocês.
Mas para um jogador mais casual que goste ou simpatize com a Fórmula 1 e queira experimentar o jogo, diria que F1 23 é literalmente a melhor entrada possível à série, uma vez que, do ponto de vista da condução, o novo sistema de tração e definições do comando tornam a jogabilidade muito agradável para qualquer nível de habilidade do jogador.